terça-feira, 20 de setembro de 2016

Essa nova política

O ano é eleitoral e o momento é eleitoreiro. Nunca antes tudo esteve tão propício à política, mais especificamente à nova política. Mas o que é isto?
Fonte da imagem: https://www.facebook.com/MariaNanquim/photos/
Tenho visto candidatos velhos e novos falando sobre uma nova política, um novo jeito de governar, legislar e de cuidar da coisa pública. Ao mesmo tempo observo os partidos, o ideal que eles representam, representaram e, ao que tudo indica, sempre representarão e não compreendo o que é esse tal  jeito novo.
Tudo o que percebo nessa gente cheia de gás e querendo fazer algo novo, por sua cidade e até pelo país é velho, se não for anacrônico.
Vejo candidatos ao legislativo prometendo serviços de competência do executivo; vejo gente nova, com ideias 'novas' apoiando e se amparando em candidatos da oligarquia local, o que obviamente representa a velha política; vejo gente nova reproduzindo velhos discursos sobre politicagem acreditando piamente estar falando de política; vejo gente extremamente despreparada e debochada dando à gestão pública a velha ideia de que não é algo sério; vejo gente fazendo a velha política de troca de favores e empregos; e, por fim, e não menos importante, vejo gente desocupada ansiando um primeiro emprego de dinheiro alto e fácil a partir da vida pública.
Na verdade eu vejo muito mais coisas a respeito desse período, mas fico desestimulada a votar por não ver nos candidatos do ano o que considero principal nesse meio: conhecimento, ou ao menos, a busca dele. Não falo de nível escolar, mas de conhecimento que se pode adquirir com a vida, com a leitura, com a observação do desenrolar da história...
A maioria das campanhas está baseada em memes de Facebook e falácias veiculadas na imprensa. A maioria dos aspirantes a prefeito e vereador demonstra claramente não entender de administração pública e por isso não é capaz de apresentar à população um projeto de governo que seja consistente, plausível e consequentemente atraente aos olhos do eleitor.
A consequência disso é o voto.  Por causa dessa forma velha de tratar o coisa pública, o voto dos eleitores será igualmente velho: eu voto porque... ah! Um voto sem convicção!
O velho discurso de que a hora de mudar é agora e de que política se faz nas urnas (para quem acredita na democracia) deveria, mais do que nunca, estar na nossa consciência de eleitor como um grilo falante. 
Não votemos no velho, nem nessa nova gente velha! Não votemos no emprego garantido, nem no apoio financeiro a determinadas instituições! Não votemos no voto que se compra! Não votemos no rouba, mas faz! Não votemos no vizinho que eu conheço, nem no palhaço que não vai ganhar! Não votemos no ficha suja (estão falando pouco desse assunto ultimamente)... Se for para não ser assim: não votemos.



segunda-feira, 18 de julho de 2016

Nota de falecimento

- Bom dia - diz o compadre!
- Bom dia, FULANO morreu, você sabia?
- Sabia não... Mas como assim, como foi????

Conversa torta essa, não? Mas é assim que funciona nas cidades pequenas. Todos querem ser os primeiros a dar a notícia de um novo defunto. Não há espaço para reminiscências nem reticências. O informe da morte deve ser instantâneo, para que mais ninguém o faça antes de si.
Fonte da Imagem:http://www.dicio.com.br/obituario/
Uma vez, conversando com um colega, discutíamos sobre a medievalidade das cidades pequenas. Elas são redutos do espírito de comunidade e unidade entre estranhos, mas ao mesmo tempo são ambientes cruéis. O anúncio da morte pode ser, para um aldeão, uma simples informação a se passar, mas, mais que isso, essa ânsia de ser o primeiro a comunicar o fato novo e o modo como isso é feito, é sim um ato de crueldade.
Antigamente, isso acontecia só de boca em boca, nas conversas de portão de manhã. Mais recentemente, as notas fúnebres vinham via ligação telefone e atualmente - podem acreditar - tudo vem via Whatsapp.
Já repreendi algumas pessoas próximas por causa desse hábito, mas não se pode interferir nos costumes das pessoas. Sim, noticiar uma morte é mesmo um costume das pessoas, Não por acaso nossos jornais estão úmidos de sangue diariamente e a coluna de obituário nunca caiu em degredo.
No entanto, penso que os adeptos dessa prática -de noticiar a morte de todo e qualquer cidadão - deveriam pensar se o ouvinte tem interesse em saber do fato. Eu, por exemplo, não gosto de saber da morte de pessoas simplesmente por saber. Penso que essa notícia deve ser algo particular aos entes queridos e próximos do finado. A morte - não sendo ela de interesse comum, tais quais aquelas que em si intrigam algum tipo de denúncia ou alerta social - deve ser experimentada de maneira discreta. É um direito da família que chora sua perda.


18 de julho de 2016.






segunda-feira, 7 de março de 2016

Educamos nossas meninas para a solidão

Tenho refletido há algum tempo sobre a educação que é dada às meninas.  Já de início peço que não generalizem as colocações que aqui serão feitas, em contrapartida peço que não ignorem que isto é algo muito comum.
Bem, já testemunhei de atos de agressão contra uma mulher jovem, bonita, que trabalha e é só isso que sei dela. Dirão vocês: “você não fez nada”. Não, eu não fiz, porque devo ter tido os mesmos medos que ela tem.
Sempre que coloco isso pras pessoas a primeira a ser julgada é a moça: “ela gosta”, “por que é que ela não larga ele”... Estas são só algumas das máximas que conhecemos a respeito de mulheres que apanham. Eu, do alto da minha inércia, já tento ver as coisas de uma forma mais profunda. Penso: que educação essa moça recebeu?
Comecei a pensar nisso quando assisti ao filme Lovelace, sobre a ex-atriz pornô Linda Lovelace, que fora aliciada pelo marido a entrar na indústria dos filmes adultos, além de sofrer outras agressões (físicas e psicológicas) do esposo. No filme, o que mais me marcou, foi quando a atriz procurou pela mãe e esta fez vista grossa, apenas disse a Linda que aquele era seu marido e que ela deveria voltar para casa. Por isso faço essa reflexão sobre como nossas meninas são educadas.
Penso que a moça que sei sofrer violência deve ter recebido o mesmo tipo de educação que a ex-atriz pornô. Considerando a época e as circunstâncias, é triste pensar que a forma como preparamos as meninas para a vida não mudou muito.
Muitas de nós podem dizer que fomos criadas para estudar e trabalhar, eu ao menos posso dizer isso. Mas sou olhada como um ser deficiente por não ter a tiracolo um homem a quem recorrer quando preciso de amparo. E é aí que está a questão: que mulher nunca se sentiu extremamente sozinha no mundo ao se deparar com situações difíceis. A família pode até te amparar, mas faz isso sempre pensando que, caso você estivesse sob a responsabilidade de um homem, aquela tarefa não seria mais dela (a família), ou quando o problema for o homem, sempre surgem questões sobre como você (mulher) não soube lidar com a situação. Quantas mulheres não se sentem obrigadas a se virarem sozinhas, porque aqueles que as criaram já passaram a bola da segurança delas. Se você é só (solteira), você está só, se você tem um companheiro, é só com ele que você pode contar e, se você não pode contar com ele, adivinhe: você está só novamente.
Penso então que é essa educação para a solidão que faz com que muitas mulheres permaneçam por muito tempo junto ao seu agressor. De nada importa que a mulher seja bonita, trabalhadora – a ponto de ser independente, e estudada se ela foi educada para se sentir só.
E pergunto: alguém quer ser só? Somos seres sociais, as pessoas com força bastante para seguir uma vida só – com seus próprios meios – são extremamente rebeldes, e mesmo elas às vezes jogam a toalha.
A solidão não está em estar sozinho, mas em sentir-se só. E ela é mais feroz quando se percebe que apesar de haver pessoas a sua volta, você não pode contar com elas, ou mesmo não deve se expor para elas. Isso é feroz para homens e para mulheres, mas no nosso caso, é isso que nos leva a continuar sendo agredidas, a deixar que se apossem de nossa dignidade e nos façam sentir menores e inferiores; é essa educação que diz que a mulher deve ceder, aceitar, permanecer e nunca se rebelar...
Fonte da imagem: http://drihsantos14.blogspot.com.br/2011/04/talvez-vou-viver.html
 Do contrário, o que levaria uma jovem da cidade, cheia de informação, com formação, boa família e bons amigos a aceitar ser agredida pisco e fisicamente pelo namorado? Por que as meninas precisam deixar transparecer que suas vidas seguem perfeitas e em paz, quando se sabe que a realidade não é essa? Ou mesmo, por que tantas mulheres voltam a viver sob o mesmo teto que seu agressor depois de tê-lo denunciado?
É preciso fazer mais por nós, por nossas meninas. É preciso alertá-las de que o ser humano é só, mas não precisa ser solitário; é preciso dizê-las que há vida segura e feliz sem que haja um homem a seu lado; é preciso assegurá-las de que não é direito do homem agredi-las de maneira nenhuma e que se isso ocorrer ela deve se rebelar, se levantar contra isso. É preciso que elas saibam que podem de fato contar com alguém, que podem contar para alguém e que uma mulher não deve ser pacífica senão em situação de paz.
É preciso educar bem nossas meninas, para que elas saibam dos seus direitos, de seu valor. É preciso que saibamos que não somos obrigadas a aceitar, mas destinadas a escolher, a determinar o rumo de nossa história e que para isso sempre haverá segurança, seja de pessoas próximas ou estranhas.

Angra dos Reis, 07 de março de 2016.
Uma reflexão adiantada para o dia internacional da Mulher.